A inflação não dá trégua para o brasileiro neste início de ano. O encarecimento de itens como alimentos, remédios, serviços, transportes e combustíveis influenciou fortemente o resultado do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em março, levando-o a um nível que surpreendeu o mercado, o Banco Central e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, que estimava uma alta de 0,45%. Frustrando as expectativas, o custo de vida aumentou 0,79% no mês. Os analistas esperavam, na pior hipótese, algo próximo de 0,70%. Foi o pior março desde 2003, quando o índice ficou em 1,23%.
Comparada a fevereiro, quando o indicador marcou 0,80%, a inflação mensal ficou praticamente estável. Para abril, a expectativa é de mais pressão, puxada por reajustes de tarifas públicas e dos remédios. O resultado do IPCA de março é visto como mais um fator de tensão para o governo e para a próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que ocorre em menos de 15 dias. Os números apresentados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) superaram os prognósticos do BC, que previa a inflação acumulada em 12 meses chegando a 6,20%. O indicador foi além (6,31%) e deve furar o teto da meta oficial, de 6,5%, em abril.
Com o desempenho ruim no IPCA, o debate no Copom deve continuar a apontar para uma elevação mais pesada para a taxa básica de juros (Selic), provavelmente de 0,50 ponto percentual, o que a deixaria em 12,25% ao ano. Porém, em função dos últimos documentos divulgados pelo BC, o mercado ainda está dividido entre esse valor e 0,25 ponto percentual. A pior estimativa é de que os encargos alcancem 12,75% no fim do ano.
Alto risco
A discrepância entre o cenário da autoridade monetária e o mundo real alimenta a descrença entre os analistas do mercado financeiro. “O BC está correndo riscos muito altos. Ele é visto como aquele técnico de futebol que está perdendo de 3 X 0 aos 38 minutos do segundo tempo, acha que está tudo bem e não faz nada”, comentou Homero Guizzo, economista da LCA Consultores.
Enquanto o governo aceita um pouco mais de inflação em troca de um crescimento econômico de 4% neste ano, o consumidor sofre. A aposentada Nilda Pereira, 67 anos, e seu filho, Reynaldo Costa, 43, juntos, gastam mais de R$ 500 por mês com medicamentos contínuos. “O reajuste do salário não acompanha. Os preços estão absurdos. Nós não podemos parar com o tratamento”, reclamou Costa. “Antes, eu comprava as caixas de dois em dois meses. Agora, eu não consigo mais. Só compro quando acaba”, completou a mãe. Eles calculam que, nos últimos 12 meses, os preços subiram mais do que 30%. O remédio para diabetes, por exemplo, custava R$ 20 e passou a R$ 28.
Além dos medicamentos, que ficaram, em média, 0,40% mais caros e devem subir mais em abril, os alimentos continuaram a encarecer, registrando alta de 0,75%. Os que mais subiram foram a batata-inglesa (12,4%) e o ovo (5,08%). “Não mudou muito do início do ano para cá. Os alimentos continuam pressionando. Um pedaço desse choque vai passar, mas a inflação ainda deve seguir em ritmo intenso”, previu Carlos Thadeu Filho, economista da gestora de recursos Franklin Templeton Investments.