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CLT já prevê equidade salarial entre homens e mulheres. Por que isso não acontece na prática?

Carta de 1988 veta "diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil"

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou nesta quarta-feira projeto de lei para equiparar salários entre homens e mulheres que desempenham funções iguais. A Constituição Federal, no entanto, traz diversos preceitos que asseguram essa equidade, assim como a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Para especialistas, falta fiscalização para que essas exigências sejam postas em prática.

Levantamento do Dieese, com base em dados do IBGE, mostra que o rendimento médio real mensal das mulheres é 21% menor que o dos homens. Enquanto elas ganham em média R$ 2.305, eles recebem R$ R$ 2.909.

A especialista em Direito do Trabalho, Marcia Sanz Burmann, sócia do escritório Autuori Burmann Sociedade de Advogados, destaca que o artigo 5º da Constituição estabelece que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações”, ao passo que o 7º proíbe “diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil”.

Além disso, de forma geral, é garantido que ao trabalho igual deve corresponder salário igual. "A Consolidação das Leis do Trabalho concretiza estas garantias em vários de seus artigos, sendo que a determinação de que salários devem ser iguais “sem distinção de sexo” aparece em pelo menos quatro artigos (5º, 46, 373-A e 461)", acrescenta.

Reforma trabalhista

A Reforma Trabalhista de 2017 ainda incluiu penalidades em caso de comprovação de discriminação por motivo de sexo ou etnia. Além do pagamento das diferenças salarias devidas, é aplicada uma multa de 50% em favor do empregado. Para Marcia, entretanto, a fiscalização não é suficiente.

— As punições são poucas... apenas em casos que as pessoas saem do trabalho se sentindo lesadas e entram na Justiça. E sabemos que ainda temos um escopo insuficiente para dar conta de tantos casos. Precisaria ter uma fiscalização muito maior.

A economista acredita que incentivos fiscais a empresas realmente comprometidas com a equidade de gênero poderiam gerar resultados.

Um estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre a importância da legislação de transparência salarial publicado em setembro do ano passado mostrou que, globalmente, as mulheres ganham, em média, salários 20% menores do que os homens.

Apesar de a pesquisa não tirar o peso que educação, tempo de trabalho, segregação ocupacional, habilidades e experiência exercem para as disparidades, ela mostra que grande parte da desigualdade salarial se deve à discriminação com base no gênero.

Brasil não assinou convenção da OIT

A economista da Universidade Federal Fluminense Hildete Pereira de Melo, que pesquisa gênero e trabalho há mais de 30 anos, lembra que o Brasil não assinou a convenção 156 da OIT, relativa à igualdade de oportunidades e de tratamento para trabalhadores dos dois sexos.

O texto estabelece que homens e mulheres têm igual responsabilidade com outros membros da sua família direta que tenham necessidade de cuidados e amparo, destacando a necessidade de políticas nacionais para garantir que os trabalhadores se prepararem para a atividade econômica e progridam nas carreiras.

Segundo Hildete, apesar de as mulheres trabalharem menos horas em jornadas remuneradas, elas possuem maior carga de trabalho doméstico, o chamado trabalho invisível, porque a cultura atribui a elas a tarefa do cuidado, seja com crianças, doentes ou idosos. Por isso, ratifica a importância de ampliar o acesso a creches públicas, ensino integral e abrigos para que ocorra a mudança no cenário:

— É preciso que o orçamento público tenha recorte de gênero. Sem dinheiro, não tem administração — opina Hildete. — Também é necessário viabilizar permanência ou retorno à escola para mães adolescentes e que a licença paterna seja ampliada.

Igualdade só em 135 anos

Um relatório do Fórum Econômico Mundial sobre paridade de gênero, divulgado em 2021, estima que a igualdade de gênero demore 135 anos para ser alcançada no mundo. Nesse quesito, em um ranking de 156 países, o Brasil ocupava a 93º posição.

O levantamento ainda revela que, quanto mais a mulher ascende na sua carreira, maior a diferença salarial em comparação a homens em idêntica posição. Para posições de liderança, a equidade irá demorar mais ainda: 267 anos.

Jandaraci Araujo, cofundadora do Conselheira 101, programa de formação de conselheiras voltado para mulheres negras, acredita que um dos motivos é o peso da remuneração variável nas altas posições, com bonificações e participação sobre os lucros. Para ela, a avaliação do desempenho é contaminada por vieses culturais.

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